Vamos iniciar nosso artigo deste mês de novembro de uma forma distinta. Muito se tem comentado sobre inflação no Brasil, em torno de 10% ao ano, o que nos leva a “identificar o grau da febre, mas pouco entender algumas das principais origens”, e vamos tentar explicar de uma forma simples.
Vamos analisar os impactos que temos sofrido e a eventual tendência nos curto e médio prazos.
As fontes pesquisadas estão identificadas e todas possuem adaptações que realizamos.
- Commodities – ou commodity, no singular – é uma expressão do inglês que se difundiu no linguajar econômico para fazer referência a um determinado bem ou produto de origem primária, comercializado nas bolsas de mercadorias e valores de todo o mundo, e que possui um grande valor comercial e estratégico, tratando-se, em geral de recursos minerais, vegetais ou agrícolas, tais como o petróleo, o carvão mineral, a soja, a cana-de-açúcar e outros que, em grande parte, influenciam o comportamento de determinados setores econômicos ou até da economia como um todo, por exemplo, o petróleo, que influencia em outras atividades industriais, do comércio, que contarão com matérias-primas mais caras ou mais baratas.
É preciso levar em conta que uma matéria-prima considerada como commodity passa a ter o seu preço gerido não pelo valor estipulado na produção, mas pela sua cotação nas principais bolsas de valores do mercado internacional. Como exemplo, se o preço do algodão se elevar no mercado externo por escassez na produção mundial, o Brasil, mesmo que o produza muito, verá os seus preços elevados, principalmente para a exportação. Consequentemente, o mercado interno, nesse caso, também será afetado, pois a maioria dos produtores preferirá exportar, provocando uma alta nos preços internos, conforme a menor oferta do produto. Com isso, os produtos derivados sofrerão um rápido aumento que, muitas vezes, não é compreendido pelo consumidor, haja vista que foi motivado pela dinâmica econômica internacional, de cunho globalizado. Isso ocorre na atividade de alimentação, sobretudo com as proteínas, que têm grande participação no cardápio, e a paridade dólar e real contribui para isso.
A ABIA (Associação Brasileira da Indústria de Alimentação) indicou em seu site a variação em 2021 (de janeiro a novembro) das commodities agrícolas no mercado internacional (variação em dólar americano). Indicamos alguns deles:
Item | Merc. Internacional | Brasil |
Açúcar | 13,6% | 34,9% |
Café | 76,3% | 88,7% |
Óleo de soja | 56,2% | 12,8% |
Milho | 19,8% | 7,4% |
Além disso, o preço do barril do petróleo teve um aumento de 36,2% e, segundo o Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), a arroba do boi e do frango congelado tiveram evoluções de 11,5% e 12,5%, respectivamente, o que impacta em toda a cadeia de fornecimento, além da elevação nos preços da energia, gás e água. Nesse cenário é possível detectar parte dos impactos sobre a inflação dos insumos que as empresas do setor vêm sofrendo, mas pergunta-se se somente o Brasil está tendo crise de abastecimento e inflação alta.
- Inflação mundial – conforme veremos no quadro a seguir, constata-se que a inflação em alguns países está fora das metas e histórico de anos anteriores. O que se observa é que o problema é global e está diretamente ligado ao desequilíbrio entre oferta e demanda trazidos pela pandemia do coronavírus.
O segundo fator que influencia no preço das commodities citadas é a depreciação do real em relação ao dólar americano, o que nos leva às seguintes conclusões:
- Juros e a taxa de câmbio
Em meio ao problema generalizado, as economias mais vulneráveis, como é o caso da brasileira, sentem um baque extra sobre os preços. O motivo é que quando a inflação sobe nos EUA, por exemplo, existe uma perspectiva de que os juros vão subir por lá para conter os preços. O efeito disso é que os investidores migram seus recursos para os EUA, que é a economia mais segura do mundo, em busca de maiores rendimentos. Nesse movimento, muitos tiram dinheiro de países mais arriscados e o efeito na moeda local é de desvalorização. No caso do Brasil, um real enfraquecido significa alta da inflação, já que cerca de 30% dos preços são afetados pela moeda americana. Instituições já veem a inflação vai passar dos 10% já em 2021. As intervenções do BACEN (Banco Central), com o aumento da taxa Selic, para a redução do consumo e queda nos preços, afetam a elevação dos juros na economia, nas empresas e esfria a economia, não contribuindo para geração de empregos.
O que se observa no quadro acima é um círculo vicioso: quanto maior a saída de moeda estrangeira, maior a depreciação do real em relação ao dólar e, consequentemente, os fatores de produção, como o combustível e as commodities em geral, aumentam internamente, gerando uma espécie de “inflação importada”. O mercado exportador se torna atrativo e produtos utilizados no cardápio das empresas e das famílias, por exemplo, a proteína bovina, passam a concorrer com os preços externos.
- Crise Hídrica
A seca histórica que atingiu o país no inverno influenciou diretamente na qualidade do produto ofertado, e houve ainda geadas que atingiram as plantações de café e canaviais. Segundo o IBGE, o mau desempenho da agropecuária foi influenciado por perdas de café, algodão, milho e cana-de-açúcar, e na pecuária, especialmente na criação de bovinos. Há que se destacar, ainda, que a escassez de produtos e o encarecimento dos insumos, agravados pela elevada cotação do dólar, tem abalado o segmento agropecuário desde o início da pandemia.
O LFV tem encarecido o cardápio, pois além do aumento no preço de compra, operacionalmente, há que se colocar produto de qualidade para o consumidor, levando assim a um desperdício adicional no momento da triagem desses produtos.
- Impactos nas empresas / clientes
A pandemia trouxe, inicialmente, às empresas em geral, uma capacidade ociosa e, com o reinício das atividades e aumento no consumo, tem gerado uma inflação de custos em nível global que afeta a todas as economias do mundo, e o Brasil não é uma exceção.
Artigo do jornal Estado de São Paulo, assinado por Eduardo Rodrigues, em 2 de dezembro de 2021, retrata que algumas empresas entregaram seus produtos com prejuízo para o cumprimento de contratos, após o salto nos preços dos insumos nacionais e importados, com aumentos de até 40% em dólar de componentes importados da Europa e da Ásia. Os insumos nacionais, como chapas de aço e resina plástica, subiram em 2021, respectivamente, 177% e 78%, e as caixas de papelão para embalar e entregar dos produtos dobraram de preço.
Cita, ainda, que muitas têm sofrido com os prazos de entrega de insumos pelos fornecedores, que ficaram mais longos, de 30 a 40 dias para 90 dias, o que obriga as empresas a um maior custo de armazenagem e de capital de giro.
Creio que pudemos, de forma simples e resumida, apesar de um pouco longa, dar uma visão abrangente dos fatores que influenciam no atual índice de inflação e, tudo indica, face a conjuntura internacional e, evidentemente, os aspectos internos de nosso país, que ela não arrefecerá e, adicionalmente, vai depender do que acontecer nas economias dos países do primeiro mundo. Somos desejosos, tal como ocorreu nos anos 80, de que não haja a tendência de “importação de inflação”.
O mesmo problema que o nosso país vivencia tem ocorrido nos demais países, inclusive com crises com aumento no custo da energia elétrica. O período de inverno no hemisfério norte irá contribuir para que haja uma inflação acima dos patamares históricos.
- A inflação dos gêneros alimentícios em novembro/21
A nossa consultoria apura e presta mensalmente informação qualitativa, objetivando orientar os gestores de empresas de alimentação a respeito da inflação dos gêneros alimentícios, e seus impactos na erosão dos lucros.
A nossa metodologia considera preço à vista nos maiores atacadistas do Estado de São Paulo, tomando-se um cardápio-base composto por itens componentes do desjejum, almoço (incluindo sopa), lanche e jantar. Em novembro de 2021 apuramos uma inflação de 1,20% sobre o mês precedente, e a grande maioria da base do cardápio continua pressionando o custo das empresas de alimentação, cujo cenário é parecido com o que temos constatado nos últimos meses.
Na taxa dos alimentos, as proteínas foram as que tiveram maior alta nos preços. O peso da carne bovina chegou a 18,68% mais caro. O bacalhau (7,98%), lombo suíno (6,48%) e pernil suíno (3,44%) também tiveram aumentos. Os índices são resultados do acompanhamento de preços feito pelo Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), por todo o país, nos últimos 12 meses. Ainda que as carnes vermelhas consideradas de primeira linha tenham tido uma redução em torno de 20%, seguem registrando uma alta de 18,68% a mais do que no mesmo período de 2020.
Não somente as proteínas, mas desde que começou a pandemia, um dos maiores aumentos foi do arroz (50,71%), açúcar cristal (46,73%) e LFV (legumes, frutas e verduras) no período do inverno. O açúcar tem se valorizado com força, assim como fubá e mandioca. Nestes casos, pesquisadores do Cepea ressaltam que problemas climáticos do último inverno reduziram o volume estimado de produção, especialmente de cana, café, milho e feijão, além de terem prejudicado as pastagens. Com isso, os preços das carnes também foram influenciados pelo lado dos insumos (grãos) e diretamente pelo clima.
“A especificidade do frango é ser criado em granja, muito dependente de ração à base de milho ou de soja. Por problemas climáticos, como a estiagem que dura mais de um ano e a geada do inverno deste ano, as safras de milho e soja foram muito prejudicadas. E a criação dos frangos saiu cara”, explica Matheus Peçanha, economista do Ibre FGV.
Os ovos tiveram elevação de 20,05% no preço. O pouco trigo produzido no Brasil (70% é importado) sofreu os mesmos impactos da ração do frango, enquanto a parcela importada está mais cara em razão do dólar, acima do patamar de R$ 5,50 atualmente.
Alguns complementos de receitas e bebidas alcoólicas, como o azeite (13,69%) e o vinho (7,77%), ingredientes muito requisitados nesta época, também apresentaram alta.
- Principais indicadores de preços e as tendências no curto prazo
Segundo o site Valor Consulting (30/11/2021), os principais índices acumulados de 2021, últimos 12 meses, e do ano de 2020, são:
Índice | Nov/21 | Acumulado 2021 | Últimos 12 meses | Acumulado 2020 |
Índice da JL Consultoria | 1,20% | 23,80% | 26,52% | 14,2% (*) |
IPCA- (jan./nov.) | 1,17% | 9,57% | 10,73% | 5,52% |
INPC (jan./out.) | 1,16% | 8,45% | 11,07% | 5,45% |
IGPM (jan./nov.) | 0,02% | 16,77% | 17,89% | 23,14% |
IPA M (jan./nov.) | -0,29% | 19,45% | 20,52% | 31,64% |
IPC-M (jan./nov.) | 0,93% | 8,41% | 9,72% | 4,81% |
Verificamos que o IPA-M, que representa os preços no atacado e que em muito se aproxima da inflação das empresas de alimentação, no acumulado janeiro-novembro/21 tem apresentado um crescimento constante e gradativo.
A preocupação deve ser redobrada, todavia, há a economia de centavos no controle de custos, da previsibilidade, da escolha do cardápio mais econômico e uma preparação para a área de Compras e Planejamento de Cardápios, objetivando trazer a melhor relação custo-benefício, sem proporcionar reclamações dos consumidores e de seus clientes quanto à qualidade e repetição do cardápio.
Por outro lado, o seu cliente provavelmente está, também, passando por dificuldades econômicas e tentar realizar reajuste de preços é praticamente impossível, o que pode levá-lo a tomar preços de seus concorrentes no mercado. O importante nesses casos é tentar construir uma solução conjunta, uma terceira via, em que as partes possam chegar a um denominador comum.
- Precauções na análise pelos gestores em suas empresas
Destacamos os seguintes aspectos importantes que, em sua maioria, podem passar despercebidos pelos gestores:
a) Preço à vista, pois quando as empresas de alimentação requerem aumento de pagamento ou rebates, os fornecedores nem sempre possuem margem de lucro que suporte esses custos adicionais, repassando-os, portanto, aos seus respectivos preços de venda, com cálculo por dentro, acrescentando impostos e margem, o que aumenta o custo final;
b) A inflação interna, conforme temos demonstrado, tem se mantido muito acima dos reajustes de preços praticados, o que diminui a margem de lucro;
c) Círculo vicioso – para manutenção da lucratividade, qualquer mudança no padrão dos cardápios e de pessoal, na maioria dos casos, representa alto risco de insatisfação dos clientes e, ao longo do tempo, possibilidades de ruptura de contrato.
d) Aumento de custos pelos decretos do Governo do Estado de São Paulo. Os decretos emitidos em novembro/2020 (65.252, 65.253 e 65.254/2020) majoraram a alíquota do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços) em alimentação, de 3,2% para 3,69%, e o que pode passar despercebido é que vários produtos que compõem o custo da alimentação sofreram majoração, dentre eles proteínas, LFV, laticínios e seus derivados.
8.1 Tendências em dezembro/21
Enfim chegou dezembro, mês de festas, e consequentemente, apesar das dificuldades financeiras de grande parte dos consumidores, a tendência devido à maior procura é que os preços dos produtos de época sofram fortes majorações.
As empresas de alimentação que têm por obrigatoriedade contratual serviços especiais poderão ter um incremento nos custos de matéria-prima e, ainda considerando que é um mês em que os consumidores saem em férias, há uma redução no volume de serviços oferecidos.
O principal motivo está relacionado ao fato de que os itens que compõem a cesta básica natalina estão cada vez mais caros e, grande parte, são importados. Itens típicos da época podem chegar a 27% mais caros do que no ano passado, como é o caso do frango inteiro.
- Seu lucro está sendo consumido pela falta de controle nos reajustes de custos
Esperamos que esses comentários sirvam de alerta de como evitar a erosão de seus lucros.
Caso sua empresa deseje estruturar um processo de inflação interna de custos (que compreende mão de obra também) e, ainda, está em situação similar aos pontos enumerados neste artigo, com queda de lucratividade, insatisfação de clientes, inflação interna superior aos índices de repasse de preços, operação de logística e de distribuição, clientes ou operações com prejuízo, dentre outros, não deixe de contatar a JLucentini – Consultores Associados.
Nossa experiência permitirá ajudar a sua empresa a encontrar a melhor relação custo-benefício em toda a sua cadeia produtiva.
Cordial abraço,
José Carlos Lucentini, Msc.
CEO
Contatos:
Cel.: (11) 98848-1119
Outras fontes consultadas:
AGÊNCIA O GLOBO. Itens da ceia de Natal ficam mais caros com inflação alta: veja como economizar. 2021. Disponível em: <https://economia.ig.com.br/2021-11-21/ceia-de-natal-como-economizar.html>. Acesso em 01 de dez. 2021.
ALVARENGA, L. Natal mais caro terá alta no preço dos alimentos, decoração e presentes. 2021. Disponível em: <https://fdr.com.br/2021/11/24/natal-mais-caro-tera-alta-no-preco-dos-alimentos-decoracao-e-presentes/>. Acesso em 01 de dez. 2021.
CEPEA (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada). MACRO/CEPEA: INFLAÇÃO EM 2021 ESTÁ MENOS ASSOCIADA AOS CHOQUES DE OFERTA E AOS PREÇOS DE ALIMENTOS. Disponível em: <https://www.cepea.esalq.usp.br/br/releases/macro-cepea-inflacao-em-2021-esta-menos-associada-aos-choques-de-oferta-e-aos-precos-de-alimentos.aspx>. Acesso em 01 de dez. 2021.
COSTA, S. Inflação: preços de alimentos sobem 21,4% desde o início da pandemia. 2021. Disponível em: <https://www.poder360.com.br/economia/inflacao-precos-de-alimentos-sobem-214-desde-o-inicio-da-pandemia/>. Acesso em 01 de dez. 2021.
MAGGIONI, I. Cesta de Natal teve aumento de quase 6% em 2021. 2021. Disponível em: <https://www.cnnbrasil.com.br/business/cesta-de-natal-teve-aumento-de-quase-6-em-2021/>. Acesso em 01 de dez. 2021.
NEDER, V.; AMORIM, D. Crise hídrica restringe oferta, derruba agro e prejudica indústria. Jornal o Estado de São Paulo, pag. B2, 03 de dez. 2021.
RODRIGUES, G. Preço da ceia sofre com inflação, no segundo Natal da pandemia. 2021. Disponível em: <https://www.otempo.com.br/economia/preco-da-ceia-sofre-com-inflacao-no-segundo-natal-da-pandemia-1.2570718>. Acesso em 01 de dez. 2021.